quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Cotidiano - por Rosalva Rocha

Uma carta-homenagem cheia de saudade
(17/11/2011)


Olá tia!
O nome da coluna não poderia ser mais providencial para esta carta que estou  escrevendo. Cartas? Elas infelizmente não existem mais. Foram aos poucos relegadas a não sei qual plano mediante a chegada da tecnologia. Mas sempre serão lembradas. Assim como bilhetes, lembretes, versos e tantas outras coisas que “parece” que a maioria das pessoas esqueceu.
Cotidiano lembra coisas simples, momentos prazerosos, encantamento com flores, compartilhamento de ideias, alguns risos, quando preciso alguns choros, mas todos eles embaixo de uma estrutura feita por pequenos pilares de madeira, arrematados com arames e totalmente cobertos por trepadeiras floridas. Quanta beleza!
Era exatamente lá o “nosso lugar”. O lugar que eu procurava, sempre que possível, para abrandar a minha alma com a “sua alma”.
Poucos anos se passaram desde o seu falecimento, mas esteja certa de que todas as minhas vitórias, todas as pequenas coisas que conquisto eu penso na senhora, certa de que estará toda orgulhosa lá no céu, como sempre se orgulhou com as pequenas descobertas que eu fazia e nunca deixou de externá-las. Como isto faz falta tia! Como faz!
Uma saudade imensa das suas palavras, das orquídeas milimetricamente colocadas em vasos para comemorar o lançamento do nosso primeiro livro, do seu empenho nos pequenos detalhes quando resolvi me unir “oficialmente” com um homem pela primeira vez. Tudo foi sempre tão mágico, são sedutor.
Sabe? Hoje pintei uma tela e pensei na senhora – ela não é delicada como sempre foram todos os seus trabalhos, mas tenho certeza de que algo está sendo visto com seus olhos brilhantes e alguma manifestação eu receberei de uma forma ou de outra.
A vida anda meio “seca”. Penso que faltam as flores do seu lindo jardim, as suas mãos delicadas tecendo trabalhos manuais que tenho guardados com um carinho imenso.
As suas linhas, agulhas, rendas, trancilins e fitas estão comigo e são seguidamente utilizadas para compor algo que, querendo ou não, tem em mim a sua inspiração.
Neste momento confesso que a queria por perto – muito perto. Fisicamente.
Em função dessa impossibilidade é que escrevo esta carta, que nada mais é do que o carinho imenso e a gratidão que me auxiliam a seguir sempre em frente, pensando que o belo está nas trocas, no carinho, no “curtir” o que se faz, no “buscar” o que realmente faz a diferença. Comemorar vitórias! Nem que seja com um abraço apertado.
Obrigada por toda a delicadeza que aprendi, sem ao menos perceber, com uma pessoa tão especial.
(à tia Theresinha de Oliveira Linde)

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Nada Chega

Ingressos antecipados a partir de 17/11 na Mania de Loja e com Promoters da Região.
1º lote promocional: R$ 20 Fem e R$ 30 Masc.

domingo, 13 de novembro de 2011

No litoral

Cotidiano - por Rosalva Rocha

No jardim
(por Rosalva Rocha – 07/11/11)
E lá estava ela, regando o jardim, com os pés descalços, pensando no tempo que permeara a sua vida naquela casa, na mesma rua, com as mesmas passagens, os mesmos aromas, a vista de morros verdes e a lua que sempre aparecia no mesmo lugar.
Retornou ao passado enquanto a água respingava em seu corpo.
Seguia os conselhos de sua avó: regar o jardim sempre ao entardecer, sob pena das plantas serem queimadas sem dó nem piedade.
Naquele momento não queria dó nem piedade para as plantas e nem para si.
Sabia que o caminho percorrido até ali tinha sido intenso,
verdadeiro,
com choques elétricos que não mataram,
algumas navalhas mal afiadas que feriram – mas cicatrizaram e, por outro lado,
rosas desabrochadas,
comidas gostosas,
amores desafiadores,
paixões avassaladoras e
certa paz, angariada com o passar dos anos.
A mangueira d´água a seguia como cúmplice e o pensamento escorria como lágrima.
Uma brisa leve a acompanhou na finalização do trabalho, reforçando a certeza de que a vida é assim:
rodeada por fatos inesperados,
que devem ser relembrados,
sonhados,
nunca maltratados e  
vez ou outra jogados em um jardim ávido por água para alimentar o desejo de
ver crescer esperanças e energias por um novo tempo.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Pérolas do Rico - Socorro

SOCORRO, ESTOU SENDO DISCRIMINADO
  
Anos atrás fui fazer um curso em Brasília. Eram várias pessoas de diversos locais do país.
Antes das aulas se iniciarem, os participantes do curso recebiam o material – folhas impressas – com o conteúdo que seria tratado.
Logo no segundo dia, fui surpreendido ao receber as minhas folhas numa letra bem grande, creio que tamanho 16 ou 18 da impressão do computador. Perguntei por que razão. e os organizadores me disseram que era um direito meu, pois como era deficiente visual – tenho em torno de apenas 20% de visão – que eles não estavam fazendo nada demais e que, em qualquer circunstância desse tipo, eu deveria exigir o meu direito.
Agora, há pouco tempo, cancelei uma assinatura que tinha do jornal Zero Hora, pois os melhores artigos e, principalmente, os culturais, que são os que mais me interessam, são todos impressos em letra tipo itálico, o que me dificulta tremendamente a leitura, deixando de ser um prazer para passar a um sacrifício.
Entrei em contato com o jornal, mandei e-mail, sugerindo uma letra mais legível e, pensando em tantos outros que, como eu, sentem a mesma dificuldade. Nunca obtive nenhuma resposta.
Na semana que passou, fui a Porto Alegre para levar aos médicos alguns exames que haviam me pedido. Para evitar problemas com estacionamento, engarrafamento e outros contratempos, deixei meu carro no estacionamento do prédio onde tenho um apartamento. Tomei um ônibus e fui ao centro, descendo no fim da linha.
Depois de efetuar as minhas consultas e outras voltas, fui ao ponto de embarque e tomei novamente o ônibus. Desci na Osvaldo Aranha para ver uns livros em alguns sebos daquela zona.
Depois de perambular pelo Bom Fim, passar defronte ao antigo “Fedor”, famoso bar que não existe mais, dirigi-me para a estação Pronto Socorro para pegar o ônibus de retorno ao meu bairro.
Começaram a vir os ônibus, e eu não enxergava o destino. Mudaram os letreiros dos ônibus: colocaram um letreiro eletrônico, desses pontilhados de computador e que trocam a todo instante, informando as ruas que passam em seu trajeto.
Não teve outro jeito senão me socorrer das pessoas que estavam na estação. Pedi para me avisarem o ônibus que eu queria pegar.
Tenho um filho que reside no Rio de Janeiro. Lá eu ando de ônibus na maior facilidade, pois os carros levam bem à frente o número da linha, bem grande: 121 – 412 – 511 – 175, etc.
Imagino eu que o jornal queira ter mais leitores e que os ônibus, mais passageiros, mas com tal comportamento quantas pessoas eles estão alijando da sua clientela?
Muitas vezes penso que o deficiente sou eu, mas, na realidade, quem tem que enxergar mais adiante são os outros, pois pior que a cegueira dos olhos é a da cabeça.

Joelson Machado de Oliveira

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Reflexões Tempestivas - por Artur P. dos Santos

ERA QUASE PRIMAVERA

P/Artur Pereira dos Santos


Bastou pouco mais de meio quarteirão para observar a miséria em uma tarde comum.
Enquanto caminhava lentamente à sombra das árvores que ladeiam a avenida, ia à minha frente um homem maltrapilho: Calças esfarrapadas, ambas as pernas arregaçadas até quase aos joelhos, deixavam à mostra tatuagens sobrepostas, que impediam a descrição do que continha em cada espaço desordenadamente ocupado.
Elevando o olhar percebi que não eram apenas as tatuagens que careciam de ordem e nitidez. Os trapos completavam o quadro rústico encimado por uma cabeça, onde há muito não havia qualquer alinhamento.
Cabelos grandes e desgrenhados pareciam refletir o que cobriam: um cérebro em desalinho.
Seus passos tornaram-se mais rápidos ao avistar o contêiner de lixo postado próximo a uma das árvores. Continuei a olhá-lo pelas costas, enquanto debruçava-se sobre a borda procurando algo indefinido. Não era difícil imaginar do que se tratava.
A curiosidade fez-me parar logo adiante e esperá-lo, tinha quase certeza de que se tratava de uma pessoa jovem, o que comprovei tão logo aprumou o corpo e caminhou na direção de uma pequena lixeira oval, dessas que são afixadas em vários pontos da cidade. 
Vi balançar negativamente a cabeça, enquanto as mãos traçavam figuras no ar, como se falasse com alguém que só ele enxergava. Imaginei sua decepção por não ter encontrado o que procurava no coletor de lixo maior. Vá alguém saber por quanto tempo não se alimentava, pois em seu rosto eram visíveis as marcas da subnutrição.
A esquina da rua delimitou nossos caminhos: Ele passou para o outro lado da avenida em busca de outras fontes que saciassem sua necessidade e eu segui em frente antes que o sinal fechasse.
Ao atravessar diagonalmente a pracinha em frente ao supermercado, onde dezenas de ambulâncias ou carros de transporte de pessoas que consultam médicos na capital fazem ponto, deparei-me com um senhor de idade avançada, também mal vestido, sentado em um banco. Parecia esperar que alguém passasse ali e lhe prestasse um favor.
Logo que me aproximei esticou o braço e fez menção de entregar-me uma sacola contendo alguma coisa, pediu-me, em voz baixa, que a entregasse à Maria, apontando para outro banco a poucos metros, onde uma mulher, não menos maltrapilha, parecia dormir ao sol da meia tarde.
De início desconfiei, lembrando que poderia ser alguma coisa ilegal que quisesse passar a outra pessoa sem que as suspeitas recaíssem sobre ele. Quando vi, pela transparência da sacola, que nela continha um pãozinho e uma pequena caixa de papelão, aparentando conter uma espécie de geléia, concordei em prestar-lhe o favor.
Estendi o braço e levei a sacola até onde estava a mulher, que nem se deu ao trabalho de abrir os olhos, apenas balbuciou alguma coisa inteligível e continuou deitada. Certamente percebera a conversa entre mim e seu amigo.
Segui adiante pensando nas palavras de Victor Hugo: Só faltava, em pouco mais de meio quarteirão, ver a pior das misérias: a da criança, que, segundo ele, era pior que a da mulher, que era pior que a do homem.
Encontrei-a ao lado da porta do supermercado, de mão estendida implorava uma moedinha.