GAIOLA DOURADA
P/Artur Pereira dos Santos
O vento era o símbolo da liberdade. Tinha por cerca as árvores, que se inclinavam a sua passagem.
Os aramados, por ele trançados ao longo de seus domínios, serviam aos seus interesses e nunca à prisão de seus ideais.
Nunca houve quem limitasse sua benquerença ou fizesse resvalar pelos caminhos da desonra.
Em algum momento as forças, previsíveis para quem acompanha a evolução da tirânica insegurança, o expulsaram do chão que lhe dera vida, e onde pretendia ser pó no final da existência.
Acolhido entre os iguais, pouco se queixava do desterro forçado pelas circunstâncias. Ás vezes matava a saudade se dirigindo à velha morada e nela deixava rolar algumas lágrimas, que ocultava virando o rosto para que não vissem fraqueza e incapacidade de suportar a condição que a vida lhe impusera.
Com o tempo, o patrimônio que atestava a luta de sua vida tornara-se um peso morto e cada vez mais distante na memória abalada pela saúde. Era preciso desfazer-se e mantê-lo sob outra forma. Não a que ele sonhara para os momentos difíceis, mas a que melhor se apresentasse no contexto das necessidades.
Outras formas de sobrevivência se apresentaram com as mudanças. Algumas lhe remetiam a um aparente e merecido repouso. Entretanto, as marcas profundas da laboriosa existência cobraram seu preço: as pernas, que antes sustentavam o orgulho da espécie, agora se dobravam ao menor esforço e as mãos que trançaram, a seu gosto, o liame da vida, já não possuíam forças para seguirem o corrimão que encimava os poucos degraus que lhe permitiam ver o nascente e o poente desde a porta dos domínios que lhe acenavam.
Recusou-se, então, a ocupar o espaço que lhe ofereciam, embora merecesse repousar o corpo cansado nas melhores almofadas. De que adiantaria viver nelas ou em qualquer céu de liberdade que lhe fosse destinado, se já não possuía a força que o ajudara a domar potros, nem as asas que um dia lhe permitiram voar sobre as canchas retas das recordações. Preferiu guardar a gaiola dourada no baú das experiências não vividas.
Continuaria a olhar o céu de todas as manhãs e a acenar aos amigos, desde a frente de sua outra morada, sem remoer mágoas, orgulhoso por ter legado aos seus a dignidade com que os homens devem viver.
Chefe, como já sabes, eu gosto muito de ler as tuas crônicas e contos ... de alguma forma sempre tocam o coração. Esta está linda e algumas palavras chamaram-me a atenção, a ponto de repetí-las neste comentário, tamanha beleza: "Preferiu guardar a gaiola dourada no baú das experiências não vividas." Lindas!
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