terça-feira, 23 de agosto de 2011

Pérolas do Rico


A VINGANÇA COM ALEGRIA

Recentemente fui visitar meu filho e lamber a minha neta no Rio de Janeiro. Sempre que lá vou, meu filho me mostra um ângulo diferente da Cidade Maravilhosa. Dessa vez, fomos ao Morro da Conceição, no centro velho do Rio, entre a Gambôa, Saúde e Santo Cristo, precisamente na chamada “Pedra do Sal”.
A Pedra do Sal é o lugar onde, antigamente, havia o comércio de escravos e a exportação de sal. Os escravos carregavam as sacas de sal nas costas, suavam muito com aquele calor e ficavam todos se coçando. Para remediar a coceira, esfregavam as costas na pedra que, depois de ficar bem lisa, deram-lhe o nome de Pedra do Sal.
Quando chegamos ao alto do morro, encontramos pessoas alegres espalhadas pelas calçadas de ruas estreitas e prédios antigos. Crianças correndo nos lugares mais alargados, mesas e cadeiras na beirada dos caminhos.
Começamos a descer, rumo da Pedra do Sal, por escadarias que se infiltravam por entre os prédios e as pedras, já com o samba adentrando os nossos ouvidos. Uma aragem fresca, vinda do mar, andarilhava por entre as encostas, balançando as árvores penduradas no morro.
Quando chegamos lá embaixo, um pequeno largo, na confluência de ruas e a Pedra do Sal, ornamentado por dois botecos, uma roda de samba bem ao centro, mesinhas e muita gente.
Enquanto o samba corria solto, apreciamos todo aquele estado de espírito, tomando a nossa cerveja. Depois de ali ficarmos por um bom tempo, encontramos um colega de meu filho, que mora ali no morro. Fomos caminhando, por uma rua simples, até o Largo de São Francisco. Uma pequena pracinha, meio arredondada, cercada de prédios antigos e ao fundo um bar com toldo amarelo: Angu do Gomes.
Sentamos naquela praça, em mesas e bancos de pedra, continuamos na cerveja e pedimos o prato da casa: angu com miúdos de porco. Veio um prato grande de angu, bem molinho, aqueles miúdos por cima, uma tigela de pimenta e cerveja bem gelada. Ali, defronte ao bar, outra roda de samba. Prédios antigos, samba, boa comida, cerveja gelada, muita calmaria, noite bonita, era um magnífico cenário.
Falando com o colega de meu filho, perguntei a ele: - Porque ele gostava tanto de morar ali no morro? E ele me disse: - Isso aqui tem muita magia, muito astral, vem dos velhos escravos. Isso aqui é uma maravilha.
Quando começamos a escalar as escadarias para ir embora, subi pensando que o Carlinhos tinha razão: aquilo era um lugar muito especial.
Antigamente o sal comia o couro da negrada, e, agora, os negros comem o couro dos tamborins, no samba. É uma vingança alegre e apostólica.

Joelson Machado de Oliveira

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