domingo, 29 de novembro de 2009

Memórias da Pinheiro por Rosalva Rocha

A PINHEIRO MACHADO E O “BAÚ DA DONA MERCILDA”


Sempre gostei do novo, do insusitado, do desafio mas, por outro lado, o antigo sempre me atraiu muito, a ponto de ter exposto no meu pequeno apartamento todas as relíquias - simples relíquias - que eram adoradas pelo meu pai, falecido há 29 anos, a exemplo da máquina de escrever, do relógio-cuco, do furador de papéis, do copinho do martelinho e por aí afora.

Mas nunca tive um baú, daqueles enormes baús de madeira, arredondados na parte superior.

Sempre quis ter um e penso que o desejo tem a ver com a curiosidade dos tempos de criança, quando eu encontrava um deles e ficava imaginando o quê poderia haver lá dentro.

Lembro-me de que o baú da minha Rosalina era utilizado para guardar o enxoval do casamento com o Dodô. E o mais curioso: a camisola de núpcias (que, obviamente, continha um número infinito de botões).

Pois bem, na vizinha da minha mãe, a Dona Mercilda, também tem um baú. E, como a minha , ela costuma guardar peças antigas desde o tempo da minha infância.

A casa dela é o exemplo de um cenário muito diferente para os dias atuais: tudo é grande, o pé direito da casa é enorme, as janelas têm degraus e as paredes provavelmente devam ter sido construídas com barro.

A sua filha Luciana, minha grande amiga desde os 8 anos de idade, nos tempos de criança curtia aquele baú tanto quanto eu.

Em função da vizinhança, da amizade, afinidade e mesma idade, quando a Dona Mercilda “viajava” para a Catanduva, a Luciana sorrateiramente me avisava para que eu fosse pernoitar por lá.

E era maravilhoso! Eu simplesmente pegava o meu pijaminha, dava alguns passos e adentrava na “casa com cenário diferente”.

Naquela época, final dos anos de chumbo, não ganhávamos bons presentes ou tínhamos lindos jogos. Restava-nos a imaginação e criatividade ... e criamos muito, a ponto de criarmos “desfiles de camisolas” nestas noites, tendo como protagonista o querido baú. Sim, o baú! De dentro dele tirávamos as camisolas, muitas delas já carcumidas pelos bichos, vestíamos e saíamos a desfilar pela imensa casa. A nossa desenvoltura, aos poucos, criava contornos até mesmo profissionais e os desfiles eram dignos de aplausos, muito embora estivéssemos nós, somente nós, na platéia. Uma ria e aplaudia a outra. E vejam que nem sabíamos da existência da Zuzu Angel!

E o mais curioso é que, neste ano de 2009, 3 grandes amigas - eu, a Luciana e a Claire (por sinal “minha comadre”) - por “determinação” do destino, fizemos aniversário, somando 150 anos. A Claire em maio (nunca nos perdoou por ser a mais velha), a Luciana em julho e eu, a mais novinha, em agosto.

Queríamos fazer uma festa à três mas, como atualmente nossos públicos de amigos são muito diversos, a soma deles impossibilitaria a mesma, por questões financeiras.

Tomamos outra decisão então: passaríamos um final de semana juntas, sem filhos e sem maridos. Local escolhido? A serra. Nada melhor do que a serra para rememorarmos os bons tempos, o tempo em que tínhamos tempo para convivermos.

E os preparativos começaram em julho, já que o final de semana programado foi o de 01 e 02 de agosto.

Como sempre, a Luciana, a mais organizada de todas, ligou-me:

- “Rosalva, preciso arrumar a minha mala. O que devo levar além das roupas?”

- Eu respondi: “Leva o secador de cabelos e mais nada. Não te preocupes que eu levarei o chimarrão”.

- E, por fim, ela novamente: “E as camisolas do baú da Mercilda? Levo ou não?”

Essa colocação nos fez retornar ao passado e rirmos por minutos a fio naquela noite fria. Parecíamos duas crianças, justamente as crianças que sempre sonhamos que permanecessem em nós pelo resto das nossas vidas.

E penso que permaneceram!

Rosalva – 21/11/09

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